Em 1990, auge do hip hop americano, o grupo Public Enemy lançou a música “Fight the Power”.
Fight the power, em inglês, significa “lute contra o poder”. Desde então, as fomas de autoridade e hierarquia vem perdendo muito espaço no mundo.
Ninguém mais aceita governantes incompetentes, ou chefes autoritários. Na verdade, esse tipo de hierarquia tende a morrer com o avanço do liberalismo e das organizações mais “flats”, ou horizontais.
Por organizações horizontais, eu me refiro àquelas que não tem uma hierarquia muito bem definida. Por contrário, a hierarquia é lateral.
Uma hierarquia lateral é como a Wikipedia, por exemplo. É como as revistas científicas.
É uma avaliação e julgamento feito por COLEGAS, não por chefes. Por pessoas no mesmo nível, e não por seres super-humanos de terno fumando seus charutos.
É claro. Mas ainda tem gente que prefere ser o chefe de terno fumando o charuto. Você tem essa imagem na tua cabeça.
É muito massa pensar desse jeito, porque eu aposto com você que quando você pensa num chefe, você não pensa no Mark Zuckerberg, presidente do Facebook. Você pensa no Mr. Burns, dos Simpsons.
Autoridade e Legitimidade
A autoridade é a legitimidade de exercer o poder. Em outras palavras, a autoridade de uma pessoa dá o direito a ela fazer o que ela quiser – inclusive mandar nos outros.
E os “outros”, os subordinados, os funcionários, aceitam essa autoridade por algumas razões:
- Porque acreditam que esse tipo de sistema funciona
- Porque não questionam os hábitos velhos e antigos
- Porque são inspirados pelo cara que tem autoridade
A autoridade do gerente
O gerente, diretor, CEO, presidente, etc tem o poder de “polícia” dentro de uma organização.
Repare que eles podem te dar uma punição violenta caso você não faça o que eles querem. Eles tem o poder da caneta que assina a sua ficha rosa de demissão.
Eles também tem o poder de te promover, por outro lado. Eles tem o poder de aumentar o teu salário, e de te dar um pouco mais de autoridade.
Mas cá entre nós. É meio estranho pensar dessa maneira, né? Afinal, você pode imaginar que a tua carreira depende se o cara gosta ou não gosta de você e do teu trabalho?
Os cientistas organizacionais ao redor do mundo concordam que esse é um jeito estranho de pensar, e que as pessoas tem mudado essa concepção.
Na verdade, a autoridade de todos esses “superiores” é muito mais contestada, muito mais duvidada, do que as pessoas pensam.
Afinal, todo mundo fala mal do chefe quando tá longe dele, né?
Quando um chefe é líder?
Agora que você sabe que nenhum chefe é totalmente amado, obedecido, mas também não é totalmente odiado ou vítima de voodoo (quem nunca pensou em fazer uma macumba com o chefe que atire a primeira pedra), em quais casos os funcionários aceitam o chefe como um líder?
Vamos lá, a ciência confirma o que a gente já sabe lá no fundo:
- A atração pessoal pelo chefe (você admira ele ou ela)
- Tempo de casa (ele ou ela tá há 20 anos na empresa)
- Competência (ele ou ela é foda)
Quanto custa usar o poder?
Independente se você gosta ou não do chefe, ele existe por um motivo. Mandar e organizar o trabalho.
Um chefe está lá porque as organizações partem do pressuposto que as equipes individuais não conseguem se organizar sozinhas, então entra o ser iluminado pra bater na mesa e falar o que vai ser feito, certo?
O problema é que esse modelo, antigo, ultrapassado das organizações mecanicistas, das linhas de montagem, e daqueles filmes do Chaplin, não funciona mais.
E por isso usar o poder custa caro. E por caro, eu não digo só em aspectos financeiros.
É claro que usar o poder de um cara que é supostamente mais competente que todo o resto é caro. Ele ganha mais. Ele podia estar fazendo outras coisas, mas tá dando ordens.
Mas o grande custo desse cara usar o poder é o custo motivacional dos empregados.
Você sabe, você já viu esse filme, e já deve ter sentido na pele. Você tem uma puta ideia, um insight, uma sacada fenomenal. Você executa, você faz uma apresentação, você faz um projeto.
Mas daí quando você fala pro teu chefe, pede 15 minutos do tempo dele pra apresentar, ele te corta. Ou pior, ele nem te corta, ele não dá abertura pra você conversar.
Essa é a maneira mais fácil de perder uma equipe, cara. Aposto que depois disso, você nunca mais faria absolutamente nada para a empresa. Você faria seu trabalho, e olha lá.
Você faria o mínimo. Você faria só aquilo que está no seu cargo, e nada mais. Você não mexeria um músculo adicional para agradar ninguém.
Como matar uma organização?
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Para matar uma organização, faça todos os funcionários entender que as decisões são centralizadas em uma alma dotada de poder.
Ah, e é muito mais rápido e doloroso caso os funcionários acreditem que as decisões deles seriam melhores do que a do chefe, tá?
Está provado, desde os trabalhos em psicologia social, que a maneira mais fácil de acabar com a motivação dos funcionários é enterrar eles em um bando de burocracia e afastá-los da tomada de decisão.
Em outras palavras, e pra ser bem claro. Pra matar a sua empresa, é só tirar o poder das pessoas de tomar decisões.
O Tylenol para o Câncer
Mas ainda dá pra piorar!
Ao invés de descer da torre de marfim, do escritório luxuoso e ir até os funcionários, alguns gerentes tem a brilhante ideia.
Se é para os caras trabalharem, vamos dar incentivos financeiros. Vamos pagar mais pra quem tem mais resultado.
É isso mesmo?
Excelente. A empresa não reconhece o esforço, ela só reconhece os resultados.
Afinal, “de boas intenções o inferno tá cheio”, não é?
E porque o bordão existe, ele tem que ser verdade, né?
Olha onde a gente foi parar. Devolve tudo pros índios, bicho.
Já foi PROVADO pela CIÊNCIA que incentivos financeiros não funcionam como a gente pensa. Teorias econômicas foram refutadas faz tempo, cara.
Dinheiro não banca a tua motivação. Você pode dizer “ah, Caio, banca sim”. Então tá. Não vou discutir. Eu acredito no que a ciência fala, e ela fala o seguinte:
Funcionários que estão em uma organização tem uma motivação de dentro, intrínseca pra fazer as coisas.
Esses caras fazem o que precisam por uma satisfação interna, seja de ter um emprego, de fazer parte de alguma coisa, de estar contribuindo. Por mais que reclamem do trabalho.
Eles não fazem isso por recompensas externas. É claro que mais dinheiro é muito melhor que menos dinheiro. Mas como fator motivador, isso não funciona.
A palavra final
O uso de autoridade nas empresas tá morrendo. Só não vê quem não quer.
Com a informação por aí, solta na internet, velho, ninguém mais quer obedecer ordens.
As pessoas estão procurando significado, estão procurando relações francas e diretas, elas querem trabalhar em projetos com uma equipe horizontal. Cada um contribui do jeito que pode, e as decisões são tomadas democraticamente.
Pare de dar ordens pras pessoas. Você só tá minando a tua autoridade fazendo isso. Ou melhor, você também tá acabando com a motivação das pessoas.
Você já falou com alguém do call center da NET ou de algum banco. Viu a motivação que eles tem pra te atender?
Nenhuma pessoa foi feita pra ser robô. Pra seguir padrões previsíveis. Por mais que a gente tente colocar pessoas em caixinhas, elas não foram feitas pra isso.
Pessoas tem suas motivações de dentro. Tem vontade de crescer, de se desenvolver, de aprender.
O chefe de verdade, o líder, ele desenvolve as pessoas para que elas tenham mais autonomia.
Tendo mais autonomia, elas trabalham mais motivadas. É um ganha-ganha, todo mundo sai ganhando.
Infelizmente, muita gente não pensa em negócios em termo de ganha-ganha. Muitos ainda tem a mentalidade de que pra um ganhar, o outro tem que perder.
Por isso eu faço esse trabalho aqui. É mais uma conscientização do que uma venda. Você sabe disso.
Eu estudo desenvolvimento humano e organizacional e trabalho com isso todo dia.
Eu desenvolvo pessoas pra que elas sejam mais felizes – que na verdade é só um reflexo de alta produtividade e liberdade.
Eu desenvolvo organizações pra que elas sejam mais lucrativas – que na verdade é só um reflexo do desenvolvimento das pessoas.
Ganha-ganha, bicho. Sempre.
Faz o seguinte.
Quer mais ganha-ganha?
Eu tenho um pessoal que recebe uns emails privados, exclusivos de mim. A gente sempre conversa, e eles tiram as dúvidas deles comigo.
É de graça. Minha contribuição pra além do site.
REFERÊNCIAS
Klapper, H., & Reitzig, M. (2018). On the effects of authority on peer motivation: L earning from Wikipedia. Strategic Management Journal
Le Breton-Miller, I., Miller, D., & Lester, R. H. (2011). Stewardship or agency? A social embeddedness reconciliation of conduct and performance in public family businesses. Organization Science, 22(3), 704-721
Gubler, T., Larkin, I., & Pierce, L. (2016). Motivational spillovers from awards: Crowding out in a multitasking environment. Organization Science, 27(2), 286-303.
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