Um professor meu adicionou ao meu vocabulário (e ao meu imaginário) diferentes denotações para instituições de ensino superior. Unidroga, Uniesquina, Unigrana, Uniestelionato. Realmente, muitas organizações de ensino superior (e num post mais tarde falarei sobre a diferença de organizações e instituições de ensino superior) estão aí apenas para lucrar.
Mas alguém chega e fala: “Caio, essas organizações estão aí pra dar acesso ao ensino superior àqueles que não poderiam ter se não fosse elas.” Afinal, é melhor o indivíduo ter ensino superior, mesmo que seja uma bosta, do que não ter – e aí a bosta é garantida.
Concordo. Mas em nenhum dos anteriores nós saímos da bosta. O assunto é complicado. Primeiro, há a questão de acesso, na qual vou me estender aqui. A questão da qualidade, entretanto, é mais complicada. Como uma vez um professor me ensinou, é uma questão de agostinho: eu sei o que o tempo (qualidade) é, mas quando me perguntam sobre o que é o tempo (qualidade) eu não sei mais o que o tempo (qualidade) é.
O acesso ao ensino superior está bem correlacionado ao PIB per capita, mas não se limita a ele. Essa tendência também está ligada ao mercado de trabalho e aos custos públicos e privados de expansão (Marginson, 2016)
Perceba. Temos três tipos de acesso ao ensino superior. Primeiro, as de elite. Federais, estaduais, e PUCs, sendo bem amplo e deixando várias de lado. Segundo, temos as demais, geralmente comunitárias (no sentido legal da palavra, excluindo aquelas filantrópicas e confessionais), e aquelas com fins lucrativos. Terceiro, temos a ausência de acesso.
Nas organizações de elite, o ensino é caro, mas é aquele que mais dá credenciais. Entretanto, o que o aluno (ou a família) busca não é apenas a credencial, mas sim uma puta credencial, que vem junto com introdução à pesquisa científica, com serviços à comunidade, e altas mensalidades (ou mensalidades bancadas por mim e por você, no caso das públicas). Esses são os diretores e CEOs das empresas brasileiras, via de regra.
Nas organizações, digamos, intermediárias, o ensino não é caro, é acessível para a classe média. Nessas organizações, os cursos predominantes são aqueles de alta demanda: administração, pedagogia, tecnólogos em gestão, licenciaturas, etc. Os alunos buscam esses cursos pela credencial – “eu tenho ensino superior”.
Sem acesso, os alunos saem do ensino médio direto para o mercado de trabalho. Mas eles estão virando exceção. Em pouco tempo, sapateiros, lixeiros, motoristas (já acontece com o Uber), e outras profissões vocacionais também terão ensino superior.
Meu ponto aqui é: isso é uma tendência mundial. Na Coréia do Sul e no Canadá, mais de 98% da população adulta tem ensino superior. A tendência é que no Brasil também seja assim daqui a pouco – a não ser que nossa educação básica se mantenha no péssimo rumo atual. Mas quando pensar nisso, não acredite em ninguém que fale que “se não fosse por mim a filha da empregada não estaria estudando”. Bullshit. Isso acontece no mundo inteiro faz tempo, seu babaca.
REFERÊNCIAS
Marginson, S. (2016). The worldwide trend to high participation higher education: Dynamics of social stratification in inclusive systems. Higher Education, 72(4), 413-434.
Marginson, S. (2016). High participation systems of higher education. The Journal of Higher Education, 87(2), 243-271
Trow, M. 1974. Problems in the transition from elite to mass higher education. In OECD (ed.), The general report on the conference on the future structures of post-secondary education. Paris: OECD
Schofer, E., & Meyer, J. (2005). The worldwide expansion of higher education in the twen- tieth century. American Sociological Review, 70, 898–920.